O título do texto para esquisito, mas a história que vamos contar hoje é ainda mais estranha e algumas atitudes são impensáveis nos dias de hoje (e deveriam ser em julho de 1987).
Encontramos dentro da Hemeroteca Digital uma revista chamada “Mulherio“, que circulou entre 1981 e 1988 e era voltada para o público feminino. Ela debatia diversos temas relevantes e, entre eles, estava a experiência das policiais de saia nas ruas. Vamos ao relato.
O título e a linha fina são bastante polêmicos começa com: “A PM veste saia, e muda de imagem”.
Já a linha fina é, no mínimo, polêmica: “quem diria, as mulheres estão mudando a imagem autoritária e truculenta da PM. No trânsito de São Paulo, elas são afrontadas cantadas e chamadas de frágeis, mas estão mostrando como pode ser um novo relacionamento entre a polícia e a comunidade.”.
O relato tem como objetivo mostrar as dificuldades que as policiais enfrentavam na rua. Em uma sociedade ainda mais preconceituosa e discriminadora.
Um dos primeiros depoimentos do texto é da policial Albene Pereira da Silva, que era a responsável por organizar a esquina da Avenida Brasil com a Rebouças e falou o seguinte: “Mais de uma vez, já fui mandada para a cozinha”. Essa oficial foi uma das 130 que, na época, trocaram o trabalho administrativo por uma chance nas ruas. A revista classificou o trabalho como “basicamente assistencial da Polícia Feminina pelas agruras do policiamento de tráfego.”.
E Albene ainda confessou para a reportagem que “a maioria não se conforma”, ao falar sobre os motoristas que não aceitam ser advertidos ou multados por uma mulher. Situação diferente do que ocorria com os “bem-te-vis”, homens no mesmo cargo, que multavam e orientavam o trânsito por São Paulo.
O Coronel Carlos de Carvalho, chefe do Comando de Policiamento de Trânsito da Capital (Cepetran), afirmava que a orientação e multas de trânsito de São Paulo seria feito apenas por mulheres, que se mostraram eficientes. Em suas palavras: “Claro que há problemas, mas as moças mostraram não só serem eficientes como modificaram para melhor o relacionamento entre motoristas e policiais.”.
Nova imagem?
O pequeno relato que encontramos ainda fala na possibilidade de ter mais mulheres policiais nas ruas de melhorar a imagem da PM. O próprio coronel entrevistado pela publicação diz que: “como estavam acostumadas a prestar auxílio e informações, têm conferido ao trabalho um caráter mais educativo e de atendimento do que repressão.”.
E o coronel falava da “indústria da multa”, termo que já era comum no final da década de 80: “Essa imagem é falsa (da indústria da multa). Se fôssemos multar de verdade, as quase 150 mil multas que lavramos semanalmente seriam apenas 10% do total.”.
A grande questão polêmica da matéria, ao meu ver, vem com relação ao seguinte trecho, que transcrevo literalmente:
De maneira algo conservadora, o coronel Carvalho entende que o trabalho educativo é mais da índole feminina: “as mulheres são normalmente mais afáveis e, numa função de autoridade, acabam por ser associadas à mãe, à professora, acredita.
“Embora isto não signifique que não sejam enérgicas, são até mais do que os homens.”. Para o coronel, ser advertido no trânsito por uma mulher é, ainda mais, inibidor.
Outro ponto absurdo fica por conta da escolha dos uniforme das policiais nas ruas. A justificativa da época foi a seguinte: “a escolha da saia-calça como uniforme de trabalho teve tanto a ver com as cantadas quanto com seu inegável grau de conforto.
“As calças acentuam as curvas naturais das mulheres e, se usassem saias, as moças se veriam em uma situação embaraçosa quando precisassem correr”, argumenta a capitã Vera Maria Fávaro.
Para finalizar, as próprias policiais falaram sobre casos de machismo no trânsito em que sofreram:
“Uma vez o motorista que eu ia multar na Avenida São Luiz, por estacionamento irregular, irritou-se a tal ponto por ser advertido por uma mulher, que quase me agrediu. Ele arrancou meu talão de multas, entrou no carro xingando e sumiu“, lembrou a policial Selma Lopes dos Santos, que trabalhava no Centro.
Referência: http://memoria.bn.br/docreader/459488/695
Para mais informações sobre a mulher na Polícia Militar de São Paulo, recomendamos: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/8101/DissGBD.pdf?sequence=1&isAllowed=y
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