A Festa de Três Dias – A Comemoração do IV Centenário

Uma das maiores festas da cidade de São Paulo foi a realizada para a comemoração dos 400 anos da nossa cidade. As comemorações foram imensas e grandes eventos marcaram essas festividades. E, ao contrário do que todos imaginam, as comemorações aconteceram nos dias 9, 10 e 11 de julho do ano de 1954 e não no dia 25 de janeiro, como era o esperado.As pessoas que viveram esse momento único dizem que a cidade inteira, independente da classe social, raça ou cor, comemoraram juntos essa data importantíssima.

As comemorações foram iniciadas no dia 9 de julho, data simbólica para a cidade. Na época, era comemorado o 22° aniversário do começo da Revolução Constitucionalista de 1932.  Além de comemorar e lembrar a data, o dia 9 de julho também marcava, em São Paulo, a celebração do 4° Congresso Eucarístico Nacional.

O Começo Das Comemorações

As festividades foram iniciadas em frente à Catedral da Sé, que havia sido concluída para essas comemorações. As festividades começaram quando os padres e bispos subiram na torre e badalaram os sinos da catedral, às 00:00:03h. A festa podia começar!

A cidade começou a comemorar e podia-se ouvir carros buzinando pelas ruas, bailes e festas em vários lugares fechados e, não era incomum, ver brindes em todo lugar. Os combatentes da Revolução de 32 estavam presentes com suas fardas e os armamentos da época. As orquestras invadiram o silêncio das ruas e São Paulo começava a se integrar com o espírito da festa. Vale dizer que até um DOCE foi feito para as comemorações, o famoso Dadinho!

Na manhã daquele dia, as pessoas que passaram a madrugada toda acordadas, se reuniram em torno do Páteo do Colégio, onde militares, políticos e várias autoridades já estavam lá esperando as cerimônias.

Nessa ocasião, o corneteiro da revolução de 32, Elias do Santos, tocou a Alvorada e fez com que gradativamente, as pessoas se ajoelhassem no chão, em homenagem à cidade. O próximo passo foi o toque dos clarins, dando início ao hasteamento da bandeira nacional.

Aos poucos, chegava a próxima atração da festa: a Banda Marcial dos Fuzileiros Navais do Rio de Janeiro, fazendo suas famosas evoluções. E assim contornavam o marco do Páteo do Colégio.

E a Associação das Emissoras de São Paulo (AESP), uma das organizadoras da festa, foi a próxima a aparecer nos festejos. A AESP convocava os principais locutores das rádios para fazer suas homenagens à São Paulo. Entre eles Murilo Antunes Alves, da Rádio Tupi.

Comemoração do IV Centenário da Fundação da Cidade, no Anhangabaú, em 1954.

Saindo dali, era a hora da missa campal da Praça da Sé. Conforme os dados obtidos pela AESP, aquele foi o ponto mais forte do evento, comparecendo à missa 200 mil pessoas. Este terceiro acontecimento foi o mais empolgante. Os heróis de 32 receberam suas homenagens no contexto da missa.

Foi quando veio a Banda Miami Jackson High Scholl, que com números de piruetas e evoluções conquistou a admiração do povo. A Rádio Bandeirantes pediu a esta banda que tocassem o “Hino do IV Centenário” .

Vale o destaque, para a comemoração desse grande evento, Oscar Niemeyer criou  a famosa Voluta Ascendente, símbolo que representava o crescimento da cidade, já que o slogan da metrópole na época era: São Paulo, a cidade que mais cresce no mundo.

Obra de Niemeyer: a Voluta Ascendente.

Entretanto, há uma polêmica ao redor do símbolo das comemorações. Ele deveria estar no Parque do Ibirapuera, inaugurado em agosto de 54, e que fez parte do pacote de monumentos entregue para o IV Centenário.

Niemeyer afirmava que  fez o desenho, mas que, em concreto, ele nunca foi erguido. A espiral foi erguida sim, mas ao desafiar as leis da física não conseguiu se manter em pé e se desfez poucos dias depois. A obra foi erguida pelo engenheiro Zenon Lotufo, mas não teve base de sustentação forte o bastante.

A Famosa Chuva de Prata

Outra grande festividade da época foi a famosa chuva de prata, organizada pelas Indústrias Pignatari com a colaboração da AESP e da 4ª Zona Aérea da FAB (Força Aérea Brasileira).

Foram feitos vários treinos de vôos noturnos antes da festa, sem que as pessoas entendessem o porquê. A idéia era jogar triângulos prateados ao povo. Para colocar os sacos, com estes triângulos nos aviões, tiveram que tirar todos os bancos de passageiros e colocaram carretilhas, para que eles deslizassem até a porta de cada avião, jogando os triângulos aos céus.

No dia Randal Juliano, pela Rádio Record dizia sobre o espetáculo: “O sentimento do paulista faz com que a cidade se locomova até o Viaduto do Chá. E aqui a multidão ergue os olhos para o céu, de onde caem lâminas metalizadas. Lâminas coloridas metalizadas sobre o viaduto do chá. Iluminadas por holofotes do exército, com o esplendor e luminosidade bonita. Traduzindo a alegria do povo paulista neste nove de julho, que comemorava uma derrota. Talvez tenha sido o único povo a comemorar uma derrota”.

Chuva de Prata em comemoração do IV Centenário.

Dizem que eram mais de um milhão de pessoas nas ruas, satisfeitas e estupefatas com tudo aquilo.

Corrida de Revezamento e o Fim da Primeira Noite de Festa

No fim da festa, ainda naquele fim de noite, fizeram a corrida de revezamento, com os principais esportistas do Brasil. A tocha percorreu a cidade de São Paulo inteira. E sua pira estava localizada no Pátio do Colégio.

Entre os esportistas estava Adhemar Ferreira da Silva, que percorreu o último trecho da corrida até acender a pira olímpica da celebração.

Logo após a corrida, um novo desfile aconteceu. E os civis e militares (até os revolucionários de 32) se uniram para organizar a Marcha Aux Flanbeau (marcha com tochas na mão). Em seguida bandas passaram, depois grupos esportivos (entre eles o Corinthians), o contingente da Força Aérea (os que não estavam na organização da Chuva de Prata) e a banda da Força Pública.

O fim do Estado Novo era recente. Mesmo assim, Getúlio Vargas não perdeu tempo e incentivou a festa, homenageando os trabalhadores paulistas, que sempre foram contra o seu governo. E o encerramento do desfile foi feito pelo Corpo de Bombeiros, que colocou seus carros na rua de sirenes ligadas. Motos e cavalos do Batalhão de Guardas compareceram. E a montaria dos Dragões da Independência finalizou o espetáculo.

Comemoração do IV Centenário de fundação da cidade de São Paulo.

O dia 10 de julho foi composto, prioritariamente, com festas infantis. Na frente da TV Tupi, que ficava no Sumaré, as crianças podiam se divertir com brincadeiras e várias atividades organizadas para o público infantil.

Nesse dia, também, foi recitado o hino do IV Centenário. Na Rádio Bandeirantes, o Coro do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal (RJ), sendo maestro o Comandante (e coronel) Sadoff de Sá, o mesmo que fez a regência do hino da festa, no desfile do Anhangabaú, regeu esta mesma canção, o “Hino do IV Centenário”, do sanfoneiro Mário Zan, enquanto as pessoas batiam palmas e cantavam juntas.

Letra do Hino:

1º parte:

São Paulo, terra amada

Cidade imensa

De grandezas mil!

És tu, terra dourada,

Progresso e glória

Do meu Brasil!

Ó terra bandeirante

De quem se orgulha nossa nação,

Deste Brasil gigante

Tu és a alma e o coração!

Refrão:

Salve o grito do Ipiranga

Que a história consagrou

Foi em ti, ó meu São Paulo,

Que o Brasil se libertou!

O teu quarto centenário

Festejamos com amor!

Teu trabalho fecundo

Mostra ao mundo inteiro

O teu valor!

2º parte:

Ó linda terra de Anchieta,

Do bandeirante destemido.

Um mundo de arte e de grandeza

Em ti tem sido construído!

Tens tu as noites adornadas

Pela garoa em denso véu,

Sobre seus edifícios

Que mais parece chegarem aos céus!

(Refrão)

A festa do IV Centenário seria encerrada no dia seguinte, 11 de julho, com várias apresentações circenses e uma grande queima de fogos.

Cerca de 200 mil pessoas compareceram ao Alto da Lapa para prestigiar a festa e o céu incendiado de fogos de artifício, uma das últimas homenagens à cidade. O auge do espetáculo foi a recriação, em fogos, da baiana Cachoeira de Paulo Afonso. E ao lado dela, desenrolaram-se rapidamente duas grandiosas faixas. Aparecendo nestas as bandeiras da cidade e a do Estado de São Paulo.