Marinex e Duralex: a história da Vidraria Santa Marina

Um dos times operários mais antigos de São Paulo corre o risco de acabar devido ao fim de um acordo com uma grande multinacional. Início de texto esquisito, né? Mas ele tem tudo a ver com a Vidraria Santa Marina, empresa que foi um marco no desenvolvimento industrial da cidade.

Criada em 1895 pela iniciativa de Elias Fausto Pacheco e Antonio da Silva Prado, aquele mesmo, um de nossos primeiros prefeitos, a empresa surgiu como Prado & Jordão.

Recorte do Correio Paulistano em 14 de abril de 1897 destacando a fundação da vidraria

A fábrica da empresa ficava perto do Rio Tietê, fonte natural de areia branca de boa qualidade e água pura, essencial para a fabricação do vidro. É possível dizer que a Santa Marina foi importante para a urbanização de bairros como a Água Branca, Pompéia, Lapa e a Freguesia do Ó.

Vidraria Santa Marina em 1918

Na época de constituição da fábrica, esses lugares eram campos isolados e sem muitos moradores. A chegada da Santa Marina mudou esse panorama. Os proprietários fizeram questão de erguer um conjunto habitacional perto da empresa para acomodar seus operários.

As casas eram modestas, mas tinham “luxo” para a época: água, luz elétrica e carvão para os fornos domésticos. As escolas da vila operária também eram boas: as crianças aprendiam português, francês e italiano.

A foto da “Vila Cia. Vidraria Santa Marina”. Aproximadamente décadas de 1930 e 1940

Em 1901, Antonio Prado se tornou o único proprietário da empresa e, dois anos depois, muda seu nome para Companhia Vidraria Santa Marina, em homenagem a uma de suas filhas. Com o falecimento de Antonio Prado em 1929, seu filho assume o lugar e a linha de produtos passa a se diversificar ainda mais: frascos para perfumes, vidro da garrafa do Leite de Magnésia Philips e fracos de penicilina.

Uma pequena curiosidade fica por conta da Vidraria Santa Marina ter vendido, a preço de custo, vidros para acondicionar mel para os soldados feridos na Revolução de 32. Recortes de jornais da época, como o visto abaixo, mostram que os paulistas doavam mel e, o próprio jornal, indicava que os frascos ideais eram os da vidraria.

Nos anos 50 a empresa se aprimorou e montou um complexo forno para construir os refratários de vidro para suportar altas e baixas temperaturas, os famosos Marinex que depois deram origem aos Duralex e Colorex.

Propaganda da vidraria

A chegada dos anos 60 trouxe outra mudança: a empresa passa para a Saint-Gobain, famosa por sua tradição na produção de vidro.  É essa mudança de dono, aliás, que propiciou o começo “estranho” do meu texto. O clube Santa Marina Atlético Clube, fundado por operários da famosa vidraria, ocupa um terreno que a Saint Gobain quer de volta. A agremiação foi fundada em 1913 e está no local desde os anos 40.

Recorte Pyrex de 1965. O anúncio foi veiculado na revista A Cigarra

Por muitos anos, a empresa e o clube dividiam espaço na Água Branca, mas desde que a empresa passou para o conglomerado francês, tudo mudou. Vale dizer que a área é avaliada em R$83 milhões. O contrato de comodato que fora assinado em 2009 com a empresa está para vencer e as chances do Santa Marina conseguir reverter a decisão judicial é praticamente nula. São menos de 120 dias para desocupar o local.

Como consolo, parte do complexo industrial da Santa Marina foi tombado como patrimônio histórico e cabe a nós cuidar dessas memórias.

Referências: http://historiasdalapa.blogspot.com/2010/02/industrializacao-santa-marina-uma-marca.html

https://www.uol.com.br/esporte/ultimas-noticias/2021/07/13/clube-centenario-de-sp-sofre-derrota-na-justica-e-deve-perder-terreno.htm