Um dos mais importantes pintores que já passou pelo Brasil, o lituano Lasar Segall, nasceu na pequena cidade judaica de Vilna em 1889. Filho de Esther Ghodes Glaser Segall e Abel Segall, Lasar era o sexto filho da numerosa família. O período do seu nascimento foi bastante tumultuado, afinal, na época de sua vinda a este mundo, a cidade em que nasceu estava dominada pelos czares da Rússia.
Com seu crescimento e desenvolvimento, no ano de 1905, com dezesseis anos de vida, Lasar ingressa na Escola de Desenho onde começa a ser estimulado a viajar para continuar seus estudos artísticos. Um dos grandes influenciadores para que isso aconteça é o já consagrado Antokolski, sobrinho do escultor Mark Matveevich Antokoski, outro artista da cidade de Vilna que fez carreira em Paris.
Incentivado pelo colega, Segall segue para Berlim onde faz residência e recomeça seus estudos para formação artística. Ali ele frequentaria a Escola de Artes Aplicadas e, logo depois, a famosa Academia Imperial de Belas Artes de Berlim, onde foi admito com uma cobiçada bolsa de estudos.
A Saída de Berlim e Uma Visita Ao Brasil
No ano de 1910, Segall decide sair de Berlim e se transferir para a cidade de Dresden, onde começa aa estudar na Academia de Belas Artes, mas com o cargo de aluno-mestre e com ateliê próprio, fato que permite uma liberdade ímpar de criação. Em 1911, após longos anos longe de casa, decide visitar sua numerosa família em Vilna.
Após essa visita, já em 1912, o pintor decide dar uma passada em Amsterdã, de onde surgem suas primeiras gravuras. Suas inspirações são pessoas idosas do asilo da cidade. No final desse mesmo ano, Segall ainda passa pelo porto de Hamburgo, na Alemanha, a caminho do Brasil, onde já moram três de seus irmãos: Oscar, Jacob e Luba.
Em março de 1913, Segall fez a sua primeira exposição no Brasil. Em um salão alugado na Rua São Bento, nº 85, ele mostra seus trabalhos de transição entre o impressionismo e seu próprio estilo, que começava a tomar forma. Dois meses depois, em maio, Segall já começa a dar aulas e uma de suas alunas é Jenny Klabin, que seria idealizadora do Museu Lasar Segall, muitos anos depois.
Ainda nesse mesmo ano, mas dessa vez no mês de junho, Segall realiza uma exposição no Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas, que adquire sua pintura intitulada Cabeça de Menina Russa, feita em 1908. Ao final do ano, o pintor decide voltar à Europa e deixa no Brasil várias de suas obras em coleções nacionais. Uma dessas coleções fora a de Freitas do Vale, que ficou com três trabalhos do artista, incluindo o Auto-Retrato I, de 1911.
Após sua partida, Segall decide visitar a França por três semanas. Ali faz visitas sistemáticas ao Museu do Louvre, de onde tiraria várias de suas influências. Quando retorna a Alemanha, conhece Margarete Quack que, com o fim da Primeira Guerra Mundial, se torna sua esposa.
Logo depois dos terríveis acontecimentos da guerra e de seu casamento, Segall recebe autorização do governo para regressar a Dresden onde fica hospedado na casa de Victor Rubin, uma espécie de patrono dos artistas da cidade.
No final de 1916 o artista decide voltar à sua cidade e tem uma terrível surpresa: a pequena Vilna foi destruída pela guerra. A impressão que sua casa lhe passa, com pessoas miseráveis jogadas nas ruas e as ruínas de várias construções, acabam por lhe marcar permanentemente. Na ocasião ele produz uma série de desenhos, litografia e gravuras em metal que, curiosamente, ele marca com o ano de 1917. O artista acaba passando algum tempo em sua cidade natal e, em 1918, é praticamente obrigado a ficar por lá.
Entre os meses de agosto e novembro ele contrai a terrível gripe espanhola e, após se curar, volta a Dresden. Ali, com o prefácio de Will Grohmann, publica o álbum 5 Litographien nach der Sanften (Cinco litografias sobre Uma criatura dócil), inspirado no conto Krotkaya (Uma criatura dócil), de Dostoievski.
A Fundação De Um Grupo de Artistas e As Grandes Exposições
No ano de 1919, com os amigos Otto Dix, Conrad Felixmüller, Will Heckrott, Otto Lange, Constantin von Mitschke-Collande, Peter August Böckstiegel, Otto Schubert, Gela Forster e o arquiteto e escritor Hugo Zehder, funda a Dresdner Sezession – Gruppe 1919 (Secessão de Dresden, Grupo 1919). A primeira exposição desse grupo aconteceu na Galeria Emil Richter, em Dresden, entre abril e maio desse ano.
Segall ainda nessa época foi um dos 141 convidados para responder um questionário organizado pelo Arbeitsrat für Kunst (Conselho dos Trabalhadores da Arte), sobre o papel do artista na sociedade e as relações da arte com o Estado.
No ano seguinte acontece uma de suas primeiras grandes exposições no museu Folkwang, em Hagen, no Oeste da Alemanha. Entre outros trabalhos, estão presentes nessa mostra as telas Kaddish (1917), Morte (1917), Gestante (1919), Meus avós (em sua primeira versão; a tela foi depois retrabalhada e datada 1921) e Auto-retrato (1919). A partir de então, ele teria destaque em várias exposições.
Em 1921 ele é um dos protagonistas da Exposição de Arte Russa, na Galeria von Garvens, de Hannover, entre março e abril. Na sequência ele participa, dessa vez como organizador, da exposição de arte moderna italiana Valori Plastici. O ano ainda é proveitoso no campo das amizades, afinal, se torna amigo de Wassily Kandinsky, além de El Lissitzki, Naum Gabo e Alexander Archipenko.
O pintor ainda participaria da Internationale Kunstausstellung (Exposição Internacional de Arte) de Düsseldorf, em 1922. Representa a Secessão de Dresden no Congresso da União dos Artistas Internacionais Avançados, simultâneo a essa exposição. Em sua autobiografia, Segall diz que foi nessa ocasião que conheceu os pintores Max Ernst, Yankel Adler, Arthur Kaufmann e Gert Wollheim.
As Últimas Exposições Na Europa e A Volta Ao Brasil
O ano de 1923 é bastante proveitoso para o pintor. Ele realiza a exposição individual de gravuras na Galeria Fischer, de Frankfurt e no Gabinete de Estampas do Museu de Leipzig. É o responsável por ilustrar livro Maasse-Bichl (Pequeno livro de estórias), de David Bergelsohn, com 17 gravuras (Ed. Wostock, Berlim). Em novembro desse mesmo ano, Segall e sua esposa Maragarete decidem vir ao Brasil de maneira definitiva.
A sua estadia no Brasil começa pelo Rio de Janeiro e, na sequência, Santos. O pintor decide estabelecer sua residência na cidade de São Paulo, mais especificamente na Rua Oscar Porto, 31. Aqui, em terras tupiniquins, ele começa a ter contato com os modernistas, entre elas Olívia Guedes Penteado, que se tornaria sua amiga.
O artista realiza sua primeira exposição individual no país na Rua Álvares Penteado, número 24, com obras feitas na Alemanha. Nessa época seu casamento acaba e, sua antiga companheira, decide voltar a Berlim. Em novembro, executa trabalhos de decoração para o Baile Futurista, no Automóvel Club de São Paulo. Faz a conferência “Sobre Arte”, na Vila Kyrial, residência do senador José de Freitas Valle, importante ponto de reunião de artistas e intelectuais.
Com o passar do tempo e a proximidade com Olívia Guedes, Segall é convidado a decorar o Pavilhão de Arte Moderna, de propriedade de sua amiga. O local ficava localizado na Rua Conselheiro Nébias, onde se reuniam os modernistas.
Mário de Andrade ao analisar esse tralho, disse que: “Segall se revelou na decoração desse salão um idealista excelente. Um idealista de felicidade. E me parece que foi esse idealismo que lhe permitiu chegar nos quadros atuais a um conceito mais realista de realidade, abandonando aquele trágico mortificante e incessante que lhe caracteriza toda a obra anterior à fase brasileira”. Nesse mesmo período pinta a famosa tela Paisagem brasileira (1925) e, em junho, casa-se com Jenny Klabin. O casal passa a lua-de-mel no Rio de Janeiro. Em dezembro, Segall e Jenny viajam para a Europa.
A Morte do Pai e a Naturalização
Dois anos após seu casamento e muitas exposições depois, um trágico acontecimento marca sua vida: o falecimento de Abel Segall, seu pai. Após todas as cerimônias e homenagens, Segall decide se naturalizar brasileiro e, em dezembro de 1927, realiza uma exposição individual na Rua Barão de Itapetininga, no centro. Vale dizer que, sua mudança ao Brasil, em suas próprias palavras, foi a responsável por trazer as suas pintura “o milagre da luz e da cor”.
Entre os anos de 1927 e 1928, Segall realiza exposições individuais que são conhecidas como sua “fase brasileira”. Nesse período fica clara a influência do Brasil em suas artes, tais como as figuras dos negros, plantas tropicais e as favelas. Em novembro, a Pinacoteca do Estado de São Paulo adquire a pintura Bananal (1927). Em dezembro de 28, volta à Europa, residindo por quatro anos em Paris, onde começa a esculpir.
Sua volta ao Brasil é marcada pela sua residência, em 1932, na Rua Afonso Celso, onde havia o plano de se instalar uma Escola de Arte com o seu nome. Segall chega a projetar móveis e tapetes para sua residência, fato que mostra sua simplicidade e bom gosto em conformidade com as propostas oferecidas pela Bauhaus.
Em 1953 é publicado o livro Lasar Segall, de Pietro Maria Bardi (Ed. Museu de Arte de São Paulo). Participa do Instituto de Arte Contemporânea, do MASP, como consultor do curso de artes plásticas. Quatro anos depois, no dia 2 de agosto de 1957, falece em sua casa da Rua Afonso Celso em São Paulo, vítima de moléstia cardíaca.
O Museu
Sua companheira, Jenny Klabin Segall, inicia em 1967 um trabalho de autenticação de obras não assinadas, ao mesmo tempo em que cuida da conservação das obras deixadas pelo artista, com vistas à criação de um museu.
Auxiliada pelos filhos Mauricio Segall e Oscar Klabin Segall e pelo amigo Luis Hossaka, coordena várias exposições póstumas de Segall na Europa e em Israel, entre 1958 e 1962, cumprindo seu objetivo de reintroduzir seu nome no panorama artístico internacional.
A 2 de agosto de 1967, exatamente dez anos após a morte do marido, Jenny Klabin Segall falece também em conseqüência de um enfarte. Pouco tempo depois, a 21 de setembro de 1967 é inaugurado oficialmente o Museu Lasar Segall, situado na antiga residência do casal.