Mantendo o compromisso de resgatar importantes fatos históricos da nossa cidade, sem partidarizar nenhum deles, vamos ao famoso movimento organizado de 19 de março de 1964, que ficou conhecido nos anais dos livros brasileiros como a “Marcha da família com Deus pela liberdade”.

O movimento foi organizado por entidades como a Campanha da Mulher pela Democracia (Camde), da União Cívica Feminina, da Fraterna Amizade Urbana e Rural, entre outras entidades, além de apoio de políticos, como o deputado Antônio Sílvio da Cunha Bueno, apoiado pelo governador Adhemar de Barros, que se fez representar no trabalho de convocação por sua mulher, Leonor de Barros.

O grande objetivo de toda essa mobilização era o de reunir grupos de direita e conservadores contra para defender a família, o Brasil e a liberdade contra o governo de João Goulart. Havia, à época, o medo de que o Brasil sofresse um golpe comunista. O movimento de São Paulo, que mobilizou milhares de pessoas, várias fontes falam em 800 mil, foi o primeiro de uma série de manifestações civis que ocorreram pelo país.

Para quem se interessar, há um excelente trabalho de 19 páginas, da Universidade de São Paulo (USP), que fala sobre a atuação das mulheres conservadoras na organização dessas marchas pelo país. Deixo aqui o link para quem se interessar. Voltando à marcha, vale a pena relembrar alguns interessantes fatos históricos. Sempre deixando claro, o apartirdarismo do artigo. Analisemos e relembremos os fatos como eles foram. Tudo bem?

No dia 18 de março daquele ano, no jornal Folha de São Paulo, foi publicado um grande manifesto conclamando a população a comparecer ao ato. Assinado por 34 entidades da sociedade civil e, convocando especialmente as mulheres paulistas, os grupos cristãos (católicos, evangélicos e presbiterianos), além de organizações estudantis e grupos anticomunistas.

Destaco abaixo, parte do texto que convocava a população:

“O nosso direito de amar a Deus, e a liberdade e a dignidade de nossos maridos, filhos e irmãos, estão ameaçados pelos comunistas, primários em seus instintos e brutos em seus sentimentos. Eles se acham em plena marcha para submeter o Brasil à escravidão da sua ditadura retrógrada, anti-humana, anti-cristã e fracassada na quase faminta Rússia e na faminta China. Explorando condições difíceis que eles próprios ajudaram artificialmente a criar neste País da Esperança e do Futuro, os comunistas, altamente acumpliciados, preparam-se para o assalto final às Igrejas de todos os credos e a todas as liberdades de todos os cidadãos. (…) Vamos para as ruas, antes que os inimigos cheguem às nossas Igrejas! Compareça à “Grande Marcha da Família com Deus pela Liberdade” que será realizada dia 19, partindo Às 16 horas da Praça da República para a Praça da Sé.”.

O Estadão também teve um anúncio publicado em sua capa, mas no dia da manifestação.

Imagem da Marcha com Deus pela família e liberdade em 1964. Evento reuniu milhares de pessoas. Estimativas falam em mais de 800 mil pessoas

É importante dizer que essa manifestação foi uma resposta, digamos assim, aos comícios realizados no Rio de Janeiro em prol das chamadas “reformas de base”, propostas pelo então presidente João Goulart.

Ainda segundo o mesmo artigo que citei acima, o então presidente estava buscando alianças com o o PCB e a ala radical do PTB, bem como com o movimento sindical urbano e rural, para desta forma, viabilizar a realização das reformas. Durante seu comício, que aconteceu no dia 13 de março, 350 mil pessoas estiveram presentes entre elas sindicalistas, trabalhadores urbanos, rurais e estudantes, o presidente discursou afirmando que “o caminho das reformas é o caminho do progresso e da paz social”.

De imediato, sua oposição começou a trabalhar e, diversos jornais pelo Brasil falavam em “agitadores comunistas” começando a agir pelo país. Vale dizer que o resultado desse comício carioca, foi uma “pré-marcha” em São Paulo. Onde grupos de mulheres e políticos ligados à Igreja Católica se reuniram para rezar:

“Em represália ao comício de ontem no Rio, entidades católicas e democráticas desta capital promoveram uma ‘noite de oração’, às 18 horas, junto à catedral da Praça da Sé. Estavam presentes o deputado federal Cunha Bueno, a vereadora Dulce Sales Cunha, a êsposa do Governador da Bahia, D. Hildete Brito Lomanto, e mais 150 senhoras da sociedade paulistana que rezaram o têrço. Frei Bernardino de Villas Boas proferiu breve alocução, com palavras de incentivo e agradecimento às mulheres brasileiras.”.

Toda essa preparação e o medo da sociedade paulista, acabou resultando nessa marcha que falamos por aqui. Ela contou com a participação de diversos políticos, como: Auro de Moura Andrade, presidente do Senado, e Carlos Lacerda, governador do estado da Guanabara.

Curiosa imagem da marcha pela família. No canto direito, uma placa: entre vodka e whisky, prefiro pinga

A marcha, que começou na Praça da República, foi encerrada na Praça da Sé, onde foi rezada uma missa pela “salvação da democracia”. E, durante o trajeto da passeata, foram distribuídos exemplares do “Manifesto ao povo do Brasil”, convocando a população a reagir contra o governo João Goulart.

A iniciativa da Marcha da Família repetiu-se em outras capitais, mas já após a derrubada de Goulart pelos militares em 31 de março, o que as tornou conhecidas como “marchas da vitória”. O país, a partir daquele dia 1º de abril, viveria em um regime militar por 21 anos, até 1985.

Capa do estado após a tomada de poder pelos militares
Capa da Folha de S. Paulo após a tomada de poder pelos militares

Referências: https://www.revistas.usp.br/revhistoria/article/view/167214/170156

https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/AConjunturaRadicalizacao/A_marcha_da_familia_com_Deus

One Comment

  1. O Senhor Abraão começa dizendo “o compromisso de resgatar importantes fatos históricos da nossa cidade, sem partidarizar nenhum deles” mas comete uma derrapada ao utilizar o termo “regime militar” quando todos sabemos que na realidade foi uma ditadura militar.

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