O dia 5 de julho, para os paulistanos, representa um momento histórico para a cidade. Embora muitos dos cidadãos não conheçam a Revolta Paulista ou Revolta Esquecida, o acontecimento foi importante para mostrar a insatisfação de uma das principais cidades do país com o presidente do país.
Para compreender o que levou São Paulo a se revoltar com o presidente Artur Bernardes é preciso entrar de cabeça no contexto que o país vivia na época. O Brasil vivia uma profunda crise econômica decorrente da queda das exportações motivada pela Primeira Guerra Mundial que, como é do conhecimento de todos, afetou a economia das principais potências do nosso planeta. Além disso, politicamente o país também estava em um momento conturbado.
Alguns estados não suportavam mais a manutenção do poder federal entre representantes de Minas Gerais e São Paulo e, mais do que isso, sentiam que o protecionismo e valorização do café estavam passando dos limites e que, dessa forma, começavam a prejudicar a economia de outras unidades da federação.
Com esse pensamento, grupos opositores dos Partidos Republicanos paulista e mineiro se uniram para formar a Reação Republicana que, também, teve a integração de grupos do Rio Grande do Sul, Bahia, Pernambuco e do Rio de Janeiro. A maior bandeira dos “revoltosos” era que o país protegesse todos os produtos que eram produzidos aqui e não só o café, como acontecia há muito tempo.
Após todas as articulações possíveis, o Brasil chega às eleições de 1922 com dois fortes candidatos à presidência: Nilo Peçanha, apoiado pela Reação Republicana e Artur Bernardes, do Partido Republicano. O vencedor foi Bernardes e, a partir daí, começam os conflitos internos que abalariam parte do país. O começo do estranhamento surgiu quando alguns militares não queriam “autorizar” que Artur Bernardes subisse ao poder, mostrando claro descontentamento com a escolha do presidente.
O Primeiro Conflito Armado Acontece No Rio de Janeiro
Embora Artur Bernardes tenha conseguido assumir o poder, sua gestão não teve um começo nada fácil. Nem bem assume o poder, Bernardes tem que lidar com um violento conflito armado travado no Forte de Copacabana, em 5 de julho de 1922. Na ocasião, parte das Forças Armadas resolveu pegar em armas para demonstrar o imenso descontentamento com a posse do novo presidente.
Esse movimento de 1922 influenciou fortemente os rebeldes paulistanos durante todo o desenrolar da terrível Revolução Paulista de 1924. A influência foi tamanha que, os líderes da Revolta Paulista escolheram a mesma data para dar início ao movimento: 5 de julho de 1924.
Voltando ao movimento ocorrido no Rio, vale ressaltar que o levante teve a participação da ala mais jovem das Forças Armadas brasileiras que, como diziam na época, pretendiam “salvar a honra” do exército brasileiro que passava por um momento terrível cercado por “ofensas” e descaso por parte do poder público. Os revoltosos não aceitavam o fechamento do Clube Militar do Rio de Janeiro, que só aconteceu graças a um decreto presidencial.
Essa atitude do presidente da República foi uma retaliação ao protesto realizado pelos soldados contra uma ação do governo que mandou o exército intervir na política do estado de Pernambuco.
Para os rebeldes militares, esse tipo de atitude demonstrava que as instituições da república brasileira estavam com seus valores corrompidos pelos governantes que ocupavam o poder. Mais do que não concordar com essa intervenção em Pernambuco, a prisão do Marechal Hermes da Fonseca ampliou a insatisfação ao ponto de não ser possível mais controlar tamanho sentimento somente com palavras.
O movimento que tomou conta do Forte de Copacabana durou apenas dois dias e acabou sendo devastado por uma forte represália do governo federal que, inclusive, chegou a bombardear o lugar. A história brasileira mostra que esse episódio foi um dos grandes conceitos que acabaram por semear um novo movimento tenentista no país.
Após conseguir sufocar o movimento de 1922, o governo entrou em um grande conflito de ideias com os militares ao introduzir várias mudanças na Constituição Federal. Os militares entendiam que as modificações aumentavam o poder executivo e tirava o equilíbrio dos três poderes nacionais: legislativo, executivo e judiciário. A tensão, de uma maneira geral, não diminuía.
O Conceito Da Revolução Se Dissemina
A história do país mostra que, após o sufocamento do movimento surgido no Rio de Janeiro em 1922 e com as mudanças feitas na Constituição, a insatisfação com o centro do poder federal cresceu e atingiu civis e militares de todo o país.
Embora os militares tenham tomado à frente da revolta, seus motivos não eram dos mais nobres para com o país. Os integrantes das forças armadas contrários às ideias do presidente se consideravam os únicos com capacidade para restaurar a república de 1889, já que acreditavam estar acima das classes sociais e dos partidos políticos da época.
Os revoltosos defendiam a criação de uma lei eleitoral com garantias de soberania do país e do povo (vale um destaque que eles queriam essa lei com algumas restrições, já que não queriam que o “povo” chegasse ao poder). Além dessa demanda, esses integrantes das forças armadas mostravam uma grande insatisfação com relação às lentas promoções que deixaram muitos dos integrantes do exército em baixas patentes.
Assim, os “arquitetos” da revolta pertenciam a setores intermediários das Forças Armadas nacionais e, em sua maioria, eram tenentes e capitães. O grande objetivo deles era depor Artur Bernardes já que, segundo o conceito espalhado, ele era o representante das oligarquias e das elites dominantes, que eram “odiadas” pelos oficiais rebeldes. A justificativa utilizada para levar adiante o conflito foi defender e purificar as instituições republicanas que estavam corrompidas.
No ano de 1923 o exército começou a propagar sua campanha conspiratória contra o governo federal. A grande mente por trás desses planos de derrubada do governo era a do General Isidoro Dias Lopes seguido pelos capitães Joaquim Távora e Juarez Távora.
São Paulo: O Palco da Revolta
A cidade de São Paulo do começo do século XX era marcada pelo ideal de modernidade e pelo grande crescimento populacional. Começava a se desenhar o rascunho da grande cidade que aquela metrópole se tornaria. A intensa imigração e os grandes projetos de urbanização da cidade foram aspectos que mudaram completamente a forma como São Paulo era vista pelo Brasil. Soma-se a isso à burguesia rica graças ao café e temos um palco perfeito para que o estopim da revolta comece.
Os protagonistas da revolução, então, acreditavam que todos esses fatores aliados à insatisfação de parte da elite paulista com o Partido Republicano Paulista e a vigilância muito menor em relação ao Rio de Janeiro, por exemplo, tornaria o movimento iniciado em São Paulo gigante.
O grande plano dos militares de 1924 era todo baseado em ações rápidas e conjuntas. Tomar São Paulo envolvia cortar e bloquear todas as formas de comunicação da cidade, como: ferrovias, telefones e telégrafos. Além disso, o movimento contava que a população da cidade iria aderir às ideias revolucionárias e, assim, ter força o suficiente para marchar rumo à capital do país.
Dessa maneira, na madrugada do dia 5 de julho de 1924 o grupo começou a ocupar as ruas da cidade e a dominar guarnições do exército e postos policiais. Os revoltosos partiam do Quartel de Quitaúna e tinham como grande objetivo chegar ao 4º Batalhão da Força Pública. Contudo, apesar do planejamento, algumas coisas deram erradas e, a ideia de rapidamente dominar São Paulo acabou resultando em uma guerra civil que assolou a metrópole por 23 dias.
A População Apavorada E A Retira Dos Rebeldes
Diante da invasão à cidade, a população de São Paulo ficou desolada, desamparada e completamente assustada com o que estava acontecendo. A cidade, literalmente, parou com aquele movimento. Relatos da época dão conta que as pessoas não saíam de casa e tinham medo de falar com amigos e conhecidos já que, a rigor dos fatos, sequer sabiam o que estava acontecendo.
Os jornais impressos da época, a principal fonte de comunicação daquele período, pararam de circular. Com a inesperada resistência da cidade, o próprio comando revolucionário estava dividido: João Cabanas e Miguel Costa, dois dos principais líderes do movimento, queriam continuar a batalha em São Paulo para dominar a cidade e, do outro lado, Isidoro Dias Lopes acreditava que o melhor era bater em retirada para tentar uma reorganização.
Contudo, no dia 9 de julho, as forças legalistas que bravamente lutavam pelo presidente do estado de São Paulo, Carlos de Campos, e pela permanência de Artur Bernardes, deixaram a cidade. Apesar do rápido sentimento de vitória, os rebeldes logo perceberam que tinham em mãos um problema maior do que o esperado, como por exemplo, resolver as questões referentes a abastecimento e várias outras questões que começaram a minar a resistência dos militares.
A população de São Paulo, por sua vez, estava cada vez mais insegura. Sem a possibilidade de ter acesso a vários tipos de alimentos e com vários avisos de bombardeios, os habitantes que tinham a possibilidade de se afastar da capital começaram a migrar para o interior do estado.
Apesar de alguns paulistanos baterem em retirada, os mais pobres, por enxergarem a possibilidade de melhorar sua condição de vida, começaram a ver nos militares uma fonte de esperanças. Com a fuga do presidente do estado, São Paulo virou uma bagunça total, com direito a saques a armazéns, indústrias e mercados, gerando prejuízos enormes aos grandes produtores. Somente um homem público ficou para defender a cidade de São Paulo: Firmiano Morais, o quinto prefeito da nossa cidade.
Quando todos os outros representantes do poder público haviam deixado a cidade, coube a ele e aos que detinham o poder econômico, a Associação Comercial, organizar o que havia sobrado da cidade. Para se ter ideia da tragédia que se abateu por São Paulo, o bairro da Mooca, um dos mais tradicionais da nossa história, foi muito afetado e muitos paulistanos acabaram ficando sem casa e sem ter para onde ir, dependendo exclusivamente do nosso poder municipal.
Com o passar dos dias, os militares começaram a enfrentar dificuldades cada vez maiores para manter São Paulo e vencer o cerco imposto pelo poder público federal que, na ocasião, tinha 18 mil homens à disposição. Os revolucionários eram menos da metade: 7 mil. Após o presidente Bernardes declarar que São Paulo estava sob “Estado de Sítio”, a violência dos ataques federais aumentou, fatores que comprometeram os planos originais dos revolucionários.
Em uma tentativa desesperada para resolver a situação, Isidoro Dias tentou um acordo com os legalistas, pedindo completa anistia para todos os participantes da revolta em São Paulo e dos revoltosos do Forte de Copacabana. Em troca, ele se renderia junto aos seus homens e sairiam da cidade. Enxergando a vitória cada vez mais perto, os legalistas negaram o acordo, forçando uma retirada do movimento para o interior do país. Assim, no dia 28 de julho de 1924 as tropas revolucionárias começaram a se retirar da cidade. Parte do contingente se dirigiu para o interior do estado e depois para o Paraná, onde se encontraram com outros grupos militares aliados.
Logo depois de sair de São Paulo, o exército partiu em direção ao interior do estado, liderados pelo Marechal Isidoro e seu Estado Maior. A retaguarda da retirada foi executada pelo Major Miguel Costa e pelo seu Chefe do Estado Maior, Juarez Távora. Vale a curiosidade que eles retiraram, dos quartéis da Luz em São Paulo, canhões, mais de 4 mil metralhadoras, fuzis, cavalos, alimento, medicamento, 20 milhões de tiros de fuzil e metralhadora e tiros de canhão.
Cerca de 4 meses depois, no Rio Grande do Sul, o tenente Luiz Carlos Prestes, que discordava com a direção política do Brasil, liderou uma nova ofensiva militar em Santo Ângelo. Sob seu comando, as tropas foram em direção ao estado do Paraná encontrar com a coluna paulista.
Essa viagem demorou mais cinco meses, fazendo com que os soldados paulistas lutassem sozinhos durante 9 meses de intensas batalhas. Os revoltosos tentaram mais uma vez enfrentar as tropas legalistas que estavam sediadas no Mato Grosso do Sul, mas a derrota foi massacrante. Esse fato gerou uma das maiores ações guerrilheiras do Brasil, a Primeira Divisão Revolucionária, conhecida após o final do movimento como Coluna Prestes e atualmente chamada de Coluna Miguel Costa, pois os dois, Prestes e Miguel com seus exércitos juntos criaram essa Divisão Revolucionária.
Essa divisão contava com 1.500 homens bem equipados de armamentos, que eram das tropas de São Paulo e que equiparam essa divisão, e que tinha como finalidade fazer a propaganda da Revolução. Os rebeldes percorreram cerca de 20.000 km em doze estados.
O Que Restou de São Paulo?
Com a retirada final dos rebeldes era o momento de ver o que sobrara de São Paulo. Diversos bairros sofreram muito com as intervenções militares, como a Mooca, Ipiranga, Brás, Belenzinho e o Cambuci. Além da perda de bens materiais, São Paulo perdeu também mil vidas e ficamos com 4 mil feridos, sendo que desse número, a maioria era de trabalhadores que nem sabiam o que estava acontecendo.
Para dois importantes personagens da cidade de São Paulo, José Carlos Macedo Soares, presidente da Associação Comercial de São Paulo, e Firmiano Pinto, prefeito da cidade, a revolta traria resultados ainda piores. Os dois foram indiciados e considerados colaboradores de Isidoro Dias e, como punição, foram obrigados a deixar São Paulo.
Em seu exílio na França, Macedo Soares escreveu um livro chamado Justiça, no qual relata sua versão do que lhe ocorreu durante e após a Revolução. Quando ele retornou a São Paulo, em 1927, foi recepcionado como um herói.
A partir do dia 28 de julho, os jornais da época ilustravam em suas capas “A Vitória da Legalidade”, manchete que figurou por meses a fio nos periódicos. Houve comemorações e cerimoniais para festejar a volta à normalidade da cidade promovidas pelos partidários do presidente Arthur Bernardes.
O grande resultado dessa revolta pode ser explicado com a comparação feita pelas historiadoras Ilka Stern Cohen e Vavy Pacheco Borges, quando colocaram a revolução de 32 e a de 24 lado a lado: “a memória de São Paulo em 1924 – vítima invadida, violada e semi-destruída – e a memória de São Paulo em 1932 – heroína, matriz de uma Revolução”. Em uma obra publicada logo após os acontecimentos, o general Abilio de Noronha confirma a busca pelo esquecimento daqueles fatos: “Oxalá que, com a retirada dos rebeldes de S. Paulo na noite de 27 para 28 de Julho, tenham eles levado consigo, a fim de afogarem para sempre, nos pantanaes das regiões inhospitas das margens do rio Paraná, a ideia maldita da rebellião contra o governo da Republica.”
Sou paulista de Cachoeira Paulista, mas vivi minha adolescência e parte de minha vida adulta em São Paulo, nos anos 50, 60 e 70. Amo São Paulo, e viajo muito para lá, pois tenho filha e irmãos nela radicados com suas respectivas famílias. Presenciei grandes mudanças na cidade e continuo sempre interessada em tudo que se refere a Sampa. Amo esta grande e mágica cidade e jamais a esquecerei. Meus filhos mais velhos, Camila e Duarte, são paulistanos. O outro casal de filhos, é paulista, de Presidente Prudente. Assim, estou irremediavelmente ligada pelo coração à esta grande metrópole e ao nosso Estado de São Paulo.
Vale apenas mencionar um fato triste, as tropas legalistas ao entrarem em São Paulo, praticaram diversas pilhagens, inclusive com diversos casos de estrupo, mais notoriamente na Vila Nova Manchester.
Gostaria de divulgar essa parte da historia que passou em nossa cidade paraguacu paulista , pois os paulistas nao a conhecem , tenho projeto percorrer estrada de ferro nossa cidade por onde passou a revolucao